Friday, November 25, 2011

Pais e Filhos


Aloisio Santos ____ Dias e dias tenho visto nas redes sociais, mensagens muito belas sobre afetividade e a falta que sentimos de nossas mães e do quanto desejamos que elas fossem eternas. Verdade claro, com grande senso de justiça e por motivos óbvios. Já fiz um grande texto em homenagem a ela e do quanto gostaria que o destino a deixasse ainda comigo. Porém em dias como os dia hoje, especialmente, me faz ter muita saudade do meu pai. É, realmente o dia 25 de novembro é marcante, pois dentre todas as perdas, materiais, pessoais e por aí vai, essa foi uma das mais emblemáticas. Talvez por ter sido a primeira que me deixou em um estado de adrenalina limítrofe, fazendo com que a ficha caísse somente umas duas semanas mais tarde.

É em dias assim, que o senso comum de achar que os pais são heróis aparecem na minha mente. Essa é a correspondência que damos aos nossos pais. Eles são os heróis, enquanto as mães são eternas. Sempre acreditei que eles possuem as duas qualidades. Meu pai é eterno todas as vezes em que passo pelo Aterro do Flamengo e me faz lembrar daqueles passeios de domingo que ele adorava fazer e de comprar brinquedos simples como aqueles cataventos que teimavam em não girar logo depois que o vendedor deixava na minha mão. As festas de fim de ano eram sempre mais motivadas por causa dele. Assistir aos fogos de réveillon na Praia de Copacabana eram obrigatórios, mesmo que ele não pisasse mais na areia pra tomar um banho de sol há anos. Caminhar pelo calçadão em dias de sábado com jogos de futebol de onze eram liturgia sagrada.

A parcela herói que guardo está em suas batalhas diárias. De como era difícil manter uma sobrevivência unicamente por suas mãos, enquanto eu não estava ainda em idade devidamente produtiva para isso. Carregar uma mala pesada de ferramentas com um martelo daqueles igual ao do Thor, davam uma especial condição de heroísmo, principalmente depois dos 55 anos, quando a sua kriptonita, o cigarro, começou a dar seus primeiros sinais de existência. Assim como também adorava rir das insanidades dos filmes de ação. Gargalhava ao ver o Rambo explodir um militar vietnamita, com uma flecha de ponta especial. Os do Schwarzenegger então, nem se fala. Mas pelo menos, o Indiana Jones eu o fiz admirar, porque por mais mentiras que tivesse, esse era um dos heróis mais humanos que conheci do cinema. Mas as aventuras de guerra eram o seu fascínio. Acho que isso se deve ao fato de todo herói ter uma frustração. A dele era de não poder seguir uma promissora carreira na aeronáutica devido a uma pressão familiar.

Essa ligação entre o ser herói e o humano sempre me fascinou. Aquela coisa que não é exatamente de ter uma identidade secreta. Gosto que todos saibam quem é o herói e qual a sua verdadeira identidade e o que ele precisa fazer em um mundo real para que as coisas aconteçam como ele quer e vencer seus inimigos. Pais são assim. É como se eles fizessem questão disso e tudo o que precisam não é reconhecimento, nem o beijo da mocinha no fim. Basta uma cama bem confortável para recarregar as forças para o dia seguinte de luta e o meu xará era assim.

Mas lembrando da adrenalina do dia em que se foi e alguns outros que se sucederam, em que tive que ser tão herói e ao mesmo tempo tão humano para não deixar minha mãe cair junto é que me fazem lembrar sempre que o dia 25 de novembro tem uma característica peculiar. Ele simplesmente passou aquela noite de domingo, vendo comédias comigo, deu boa noite para não mais acordar. Diz minha mãe que ele ainda falou “Boa noite, minha baixinha”. Foi como se fosse uma despedida de verdade. É em dias assim, que me dou conta e que por vezes caio como todo herói de cinema, mas sempre vou lembrar de momentos simples e que os fazem ser eternos. Sinto falta, principalmente de como ele reagia a certas coisas atuais. Tecnologia, por exemplo. De que ele iria adorar ver a linda esposa que tenho (e sacana como ele era, iria me pedir emprestado pelo menos aos domingos para namorá-la no meu lugar). Ou então de achar que o seu time de futebol vive mais de marketing e de ídolos que não correspondem suas expectativas. São efêmeros e meros instrumentos para vender camisas com seus nomes nas costas.

Mas é isso aí, velho. Sei que você não bebia, mas guarde uma cerva bem gelada para um dia desses qualquer. Certamente vou ter muitas coisas para contar. Até porque ainda pretendo fazer muitas coisas baseadas em seus conceitos de vida por aqui. E é disso que os humanos-heróis são feitos.

Sunday, April 17, 2011

Por um pouco de redenção


Aloisio Santos___ Sessenta e seis anos. Essa é a distância que separa a “homenagem” americana dos Estúdios Disney ao mercado brasileiro em “Você já foi à Bahia?”, de uma produção que faz da Cidade Maravilhosa o seu cenário. “Rio” não foi somente aguardado pelos brasileiros, mas principalmente pelos cariocas que mal viram o primeiro trailer para contarem os dias para ver esta animação que, pela fidelidade com que retrata a cidade, só poderia mesmo vir da cabeça de um brasileiro - Carlos Saldanha - que já atuava na linha de frente da franquia “A Era do Gelo”.

A ave de agora não é mais o papagaio malandro tentando mostrar para um marinheiro típico americano como se anda pelas cidades brasileiras. Quem é das antigas, como eu, fez esta associação e por isso quem é dessa época, certamente se esqueceu essa obra-prima e quem é da geração 3D nem vai pensar nisso. É o filme atual que vão usar como referência. Talvez porque nesse longo espaço de tempo que separa Zé Carioca de Blu, os americanos e todos os países acima da linha do Equador, continuaram com a idéia bem errada do que somos. A não ser pela bossa-nova e pelos gols do Pelé que vieram nesse intervalo. É claro que as alfinetadas sobre a real geografia do Brasil estão presentes. É claro que a real música brasileira não é o mambo e nem a rumba e foi preciso um nativo para mostrar tudo. Ficou meio que guardada aquela associação de “enfim vão fazer um filme realmente como nós somos para o mundo ver”. De certa forma, acho que foi bem mais do que isso, foi para ver todo o nosso ego alimentado em gás hélio.

Também não espere por um roteiro brilhante, isso é uma animação. É feito para crianças e para adultos levarem as crianças sem culpa. Vai ter avô e tio querendo inventar história para tirarem os pentelhos da frente do Playstation. Com isso a história que tem o casal de araras azuis Blu e Jade em suas buscas individuais, que mostra o contrabando de aves e a preservação das espécies, serve apenas de ponto de ligação para as inúmeras situações de riso extremo, com MUITAS de êxtase profundo. Para os cariocas então, é como dizer o quanto somos foda, mermão. Por isso também esqueçam que não dá pra sair da Pedra Bonita de asa delta para descer em Copacabana, assim como o pé do Morro da Rocinha não é a Lapa.

Mas o que importa é que em “Rio”, que vale muito a pena ver em 3D e dublado (por incrível que pareça), é que este foi um gol de letra em um Maracanã lotado em cima do Uruguai em 1950, revertendo toda a história. Pode-se ver ufanismo sem nacionalismo, espetáculo sem esquecer a realidade, fascínio com ternura e mais do que tudo, deixar de lado aquela coisa de que tudo que é feito Made in Brazil, é para gringo ver. Na verdade é sim, só que de forma bem correta, didática, fiel, animada e emocionante. Vai ter gente em fevereiro no ano que vem torcendo para, quem sabe, ver o gol da final com Carlos Saldanha levantando a taça e esperando por ele para recebê-lo em cima do carro dos bombeiros.

E para os cariocas “roxos” como eu, um baita sorrisão no rosto, com aquele ar de “Chupa, Zé Carioca”!

Monday, February 28, 2011

Todos, menos você


Aloisio Santos ____ A intenção foi boa, verdade, mas foi um tiro no pé da Academia. Trazer o público jovem, antenado, descolado e principalmente conectado para os Oscars para mostrar o glamour, atrair para os cinemas em vez dos downloads ilegais e também mostrar como a Hollywood de antigamente tinha mais conteúdo e beleza, parecia ser a solução para uma cerimônia de entrega de prêmios que aos poucos vem perdendo o seu destaque. Não era para se esperar menos, visto que nos últimos anos, os vencedores da estatueta não primaram pela qualidade ou pelo padrão “oh, que esplendor” de qualidade, muito pelo contrário. É simplesmente questão de mercado, uma vez pouco tempo atrás, tentaram se adaptar a uma realidade onde o cinema independente parecia dar um novo frescor ao cinema americano. Mas acontece que as pequenas produtoras foram vendidas para as grandes e a coisa desandou de novo. De dois anos para cá, resolveram indicar dez, em vez de cinco, filmes para escolherem o que eles consideram o melhor do ano. Outro tiro no pé, pois pode até angariar uma bilheteria a mais para aquele filme que ninguém veria, mas quando a coisa fica polarizada entre um e outro, é aí que ninguém dá atenção mesmo e preferem ver em DVD mais tarde.

Um palco que de certa forma tentava dar a impressão de três dimensões (outra das tendências atuais) com fundo de cenas e imagens foi um dos poucos acertos da cerimônia, que mesmo com o atraso teve um índice sonífero apenas pouco menor do que anos atrás. E os novos queridinhos da America, James Franco (totalmente leso, embriagado, chapado, desinteressado, blasé ou seja lá o que ele tinha em mente) e Anne Hathaway (outro dos poucos acertos do dia) fizeram as honras de comandar o espetáculo. Eles são jovens, bonitos e talentosos o suficiente para fazer o gancho com o “novo público”, mas ele só queria saber de autopromoção, disfarçado de uma pretensa inovação via Twitter e ela fazia o possível e o impossível para carregar o show nas costas. Uma espécie de reflexo talvez do efeito “Rick Gervais” que detonou a entrega dos Globos de Ouro, este ano. E claro que os prêmios refletiram esse conservadorismo maniqueísta. Mesmo com 12 indicações, “O Discurso do Rei” levou apenas quatro prêmios, mas sendo alguns os principais da noite e saiu de lá como o grande vitorioso. “A Origem” também levou quatro; especificamente os já sabidos prêmios técnicos e “A Rede social” abocanhou três, com “Toy Story”, “O Vencedor” e “Alice no país das maravilhas”, com duas estatuetas cada, diluíram o que o filme inglês pretendia levar.

Mas sejamos sinceros, há quanto tempo que o vencedor do Oscar não é um filme arrebatador por excelência? Talvez “Crash”, “O Senhor dos Anéis” e “Gladiador” nos anos de 2006, 2004 e 2001 respectivamente. Comparados aos clássicos, realmente os velhinhos da Academia precisam prestar mais atenção, ou mesmo o cinema hollywoodiano se reiventar. Na verdade, a palavra “reinventar” não cabe nesse caso, pois tanto “A Origem”, quanto “Rede Social” e “Cisne Negro” fizeram sua parte. Muitos vão lembrar-se deles como cults daqui a alguns anos, assim como fizeram como “Cidadão Kane”, “Blade Runner”, por exemplo. Spielberg cantou essa bola ao entregar o maior prêmio da noite e ele pode fazer isso na boa, sem sequer ser desafiado. Ele sabe muito bem o que está dizendo.

Outros erros foram notados com clareza, fora James Franco. Celine Dion no “in memorian” (não morbidamente sempre o melhor momento das entregas de Oscar em todos os anos) foi de cortar os pulsos e a música “Smile”, imortalizada na figura de Chaplin foi pro vinagre. Sem contar que para variar, esqueceram de algumas celebridades que partiram pro andar de cima até ontem, como a Maria Schneider de “Último tango em Paris”. O momento corporativo da noite foi o anúncio da parceria de mais 20 anos de transmissão da festa pela ABC, que mais lembrava a briga futebolística brasileira entre CBF e Clube dos 13 que culminou com a confusão da Taça de Bolinhas. Tudo pelo dinheiro, meu caro amigo. A gente faz os arranjos e todo mundo se faz de contente.

E resumindo, a madrugada de 27 de fevereiro de 2011 terminou assim. A metade brasileira de “Lixo Extraordinário” perdeu para um filme dinamarquês também maniqueísta e de propostas utópicas e esperançosas. A transgressão mais uma vez deu lugar ao conservadorismo de sempre, mas cabe aqui um adendo. “O Discurso do Rei” é um belo filme. Talvez um dos filmes ingleses mais bem produzidos há tempos, mas ele conjuga da receita de bolo que Hollywood gosta de premiar. Calcado em boas atuações e com enredo que trata lutas pessoais em detrimento de um bem comum. Todos já sabiam que “A Origem” por ser meio ficção não levaria. Todos já sabiam que “Cisne Negro” não levaria por ser um filme pesado demais para a cabeça dos espectadores. Todos sabiam que “Rede Social” não levaria por tratar de um tema talvez atual demais. Quem sabe com outra versão daqui uns vinte anos terá melhor sorte e os demais como “Bravura indômita”, nem pensar. Quem quer ver uma revisão de um clássico do John Wayne ser o maioral do ano? Quem sinceramente precisa dos irmãos Coen que começam a passos largos a se repetir com seus personagens de sotaques sulistas? Realmente o Oscar precisa de frescor novo. Vai ser difícil eles entenderem isso e vai demorar muito, mas é preciso mesmo esse exame de consciência e não vai adiantar chamar a garotada com o slogan “Você está convidado”, pois nessa cerimônia todos tem o seu convite, menos você.

Saturday, February 19, 2011

Por excelência


Aloisio Santos ____ Não, este não é mais um filme inglês sobre a realeza que, volta e meia, surge na telona para falar sobre a vida e as aventuras (sexuais ou não) da família que teve sempre vocação para aparecer em um reality show. Todo mundo quer saber (mesmo os que não dão a mínima, comentam) de tudo o que se passou pela família real inglesa, desde os Anos Vitorianos. Porém essa produção é uma pequena ode à arte do cinema e fez desse episódio um dos favoritos ao Oscar desse ano. Mais do que isso, um dos principais, devido às suas 12 indicações. Esse é “O discurso do Rei”.

O período histórico é o que antecede à II Guerra Mundial e o Rei George V está em seus últimos anos de vida. O sucessor no trono é o playboy Edward, que além de defecar e caminhar pelo trono e suas implicações, quer mesmo é passar o tempo com uma americana por quem se apaixonou. Claro que a batata quente caiu no colo do irmão, o Duque de York, sempre preterido e sacaneado desde criança. Tais problemas, fora o peso de não ser um inglês comum, o deixaram com uma inconveniente personalidade introspectiva e uma gagueira sem fim. Características que caíram como luva para a interpretação de Colin Firth, aquele que com sua eterna cara de cachorro pidão, faz a loucura das mulheres que querem levá-lo para casa e dar colinho. Mas agora o desafio é bem maior do que os seus papéis anteriores, por isso foi provavelmente, a primeira vez em que Firth não se repete e fez um bom upgrade ao seu estilo emprestando momentos sensacionais, dignos de um Oscar, tamanha a dificuldade. Para solucionar o problema incompatível com uma figura pública, sua esposa Elizabeth (a futura “Rainha-mãe”) recorreu a todos os técnicos e médicos, até se deparar com Lionel Logue, divinamente e não surpreendentemente bem interpretado pelo já premiado Geoffrey Rush. O embate de personalidades e de posição social se travou por alguns momentos, mas aos poucos um foi se adaptando à realidade do outro até culminar com o tal discurso que dá nome ao filme: a transmissão pela BBC do anúncio da participação inglesa na luta contra o nazismo.

Para a direção, um nome pouco conhecido do grande público, o jovem Tom Hooper. Mais acostumado a produções para TV tem no seu currículo a premiada série “John Adams”, que serviu de credencial para essa história real. Na verdade, Hooper tratou todo o filme como seu. Há como notar nitidamente o seu toque na direção e nos enquadramentos dos personagens, propositalmente muito à esquerda ou muito à direita de acordo com os embates ideológicos, ou simplesmente para mostrar uma bela história de amizade onde, aos poucos, um se colocou exatamente no lado esquerdo do outro para o resto de suas vidas. Uma grata surpresa por assim dizer, pois o “Discurso do Rei” é primo direto de “O paciente inglês”, talvez a última produção tipicamente inglesa a levar o prêmio máximo da Academia e isso lá pelo século passado. Seu favoritismo deve levar mais três ou quatro estatuetas, dentre elas a trilha primorosa de Alexandre Desplat, que para muitos é um sucessor da linhagem de John Williams e John Barry, falecido recentemente. É um filme típico para a premiação do dia 27 e já ganhou o Bafta e o Screen Actors Guild, que mesmo sendo britânico por excelência, é bem mais do que um algo sobre a família real em um dado momento da história, mas uma homenagem à amizade, a luta de adversidades pessoais e um presente para quem ama o cinema.

Wednesday, February 16, 2011

Conforme diz a música


Aloisio Santos ____ Quem vive do lado de baixo do Equador já ouviu milhões de vezes aquele cantor que só sabe se vestir de azul e que gostaria ter um milhão de amigos, só para continuar a cantar. Quem não gostaria de ter um milhão de amigos? Pensando bem, seria demais. Uns dez, desde que sinceros e que você possa realmente chamar de amigo ou quase irmão, já está de bom tamanho. E isso não era algo difícil de conseguir a uns dez anos atrás. Para quem tem pelos menos uns “enta” anos e viveu a fase da comunicação por orelhão de rua na base da fichinha, passeava mais, brincava mais, festejava mais, curtia mais a vida e por conseqüência, ter quem o acompanhasse nessas aventuras era o fator natural das coisas. Sabe aquela máxima: “Eu era feliz e não sabia”? Pode estar bem certo que vendo o rumo dos acontecimentos hoje em dia, já se deu conta dessa felicidade nostálgica, principalmente porque para o bem e para o mal, a internet nos aproximou e ao mesmo tempo nos afastou ao encaixotar cada um de nós em nossos modems. Pois bem, toda essa filosofia de barzinho é para falar de “A Rede Social”.

O filme é baseado em toda a história que envolveu a criação do Facebook, a rede social mais influente em todo o mundo e que cresce a cada dia. O instrumento partiu da cabeça do estudante de Harvard, Mark Zuckerberg. Um total mind-freak, um nerd por excelência. Não perguntem como essa figura tinha uma namorada no campus, tanto que levou um pé atrás e a cena inicial do filme é exatamente a verborragia que detonou a relação dos dois. O roteirista teve que fazer tudo parecer como narração de corrida de cavalos, talvez para mostrar o quão inteligentes sejam os personagens. Tanto que o Zuckerberg da vida real é inteligente, mas não aparenta precisar desse poder mágico para demonstrar alguma coisa. A boa mão do diretor David Fincher que nos presenteou com o insólito “Clube da Luta” e com o instigante “Seven”, delineou o que viria pela frente. Claro que o nerd resolveu contra atacar com aquela brincadeira de barbado de dar notas e comentários a cada uma da mulherada da faculdade. A coisa tomou um tamanho maior do esperado e num piscar de olhos, várias outras universidades já queriam ter a versão mais chic, complexa e inteligente do Orkut para ampliar o seu networking (palavra pentelha para “círculo de amizades”).

Para isso, o personagem interpretado num estilo quase andróide por Jesse Eisenberg, precisa de amigos reais para tocar o negócio. Aí dois gêmeos queridinhos de Harvard e um brasileiro, interpretado pelo novo Spider Man – Andrew Garfield e até um Justin Timberlake fazendo o criador do Napster (essa é para quem tem mais de 15 anos, não pergunte) são angariados nessa luta que chegou aos tribunais para ver quem é o pai da criança. Afinal, pais precisam dizer que são os criadores e inclusive nos litígios para ver de quem é a herança. Muito bla bla bla, alfinetadas, desvios e exageros de conduta e se chega a conclusão o que muitos já sabem, como Mario Puzo deixou descrito uma vez: “Por trás de toda fortuna tem um crime”. Não um que te leve à cadeia, mas que o faça perder o sono e pensar no que fez de sua vida miserável para chegar a esse ponto. Se realmente vale a pena tanto para tão pouco? Pois essa é uma das perguntas que assola o mundo conectado de hoje e que faz com que todos queiram tudo ao mesmo tempo sem que haja tempo e vida para acompanhar o ritmo como deve ser. Neste caso, os “amigos de verdade”.

Fincher saiu da direção de clipes como o premiadíssimo e belo “Vogue”, para usar essa linguagem em seus filmes. Claro que, para isso, bons roteiros são necessários e isso ele tem nesse “A rede social”. Muita agilidade para mostrar como as coisas acontecem online para fazer deste filme um produto com oito indicações ao Oscar e diversos prêmios pelo mundo, dentre eles o Globo de Ouro e a credencial a um dos favoritos ao título do ano pela Academia. Terá forte concorrência com o “Discurso do Rei”, mas há uma possibilidade bem grande dos votantes apelarem pela lição de moral do filme que está bem escondida nas entrelinhas. E olha que para quem enxerga tudo na velocidade de uma transmissão de dados, via fibra ótica, é quase imperceptível. Depois só não pergunte porque você não tem amigos reais.

Monday, February 14, 2011

Entre o real e o imaginário (de novo)


Aloisio Santos Um dos grandes trunfos do cinema hollywoodiano é trazer ao público de todos os cantos do mundo, um mundo de ilusão e de fantasia. Fascínio que tomou conta logo no começo da II Guerra Mundial. A sétima arte sempre soube se reinventar quando novas mídias se apresentaram. Primeiro com a TV, depois os VCRs e DVDs e agora a internet. Não há melhor meio capaz de transportar nossas mentes e emoções de uma maneira tão intensa e principalmente depois de “2001, uma odisséia no espaço” o impossível tornou-se viável por mais fantasioso que possa parecer. Logo depois, esse gênero explodiu com “Star Wars” e propagado pelo mundo imaginado pela dupla Lucas e Spielberg, que além de bons contadores de histórias, também tinham o dom de aliar bons roteiros a boas imagens. Contos para serem contados por gerações. Mas porque todo esse comentário se o filme em questão é um dos melhores, senão o melhor filme de 2010, “A Origem” de Christopher Nolan?

Simples, Nolan é um ótimo contador de histórias. Quem viu “Amnésia”, sabe o que isso quer dizer. E como bom cineasta que é, soube aliar um roteiro nada linear a uma formatação final surpreendente, feito com pouquíssima grana para os padrões americanos e com imediata adoração, já se tornou cultuado. Entre seus 10 filmes realizados até agora apenas, conseguiu dar o fôlego e fidelidade do herói da DC Comics, Batman, nos fazendo esquecer praticamente as versões anteriores. Por essas e outras, que ele fez deste indicado ao Oscar, um filme de ficar travado na poltrona a cada segundo, sob o risco de perder o fio da meada com um breve piscar de olhos. Mas tudo parece simples de entendimento ao ler apenas a sinopse: “Em um mundo onde a tecnologia existe para entrar na mente humana através da invasão de sonhos, a um ladrão altamente qualificado, é dada uma última chance de redenção, que envolve a execução de sua tarefa mais difícil até então”*. Pode parecer um simples filme de ação com muitos efeitos, mas quando se trata de um diretor como Nolan, claro que as coisas mudam de figura.

Esse é um filme antes de tudo, feito para aficionados por ficção, por ação, por artes (em muito, as tomadas que contrariam o real, tem uma grande inspiração no mestre M.C.Escher – quem estiver no Rio pode conferir a sua mostra no CCBB e assinar embaixo) e para os nerds de plantão. E tudo isso misturado para servir de assunto para ficar por horas, discutido com os amigos, cada detalhe e cada cena. Por falar em cenas e detalhes, o troca-troca das seqüências dos múltiplos planos imaginários e mentais é o ponto alto deste filme sensacional. O suficiente para fazer com que versões com todos os planos ao mesmo tempo, já pipoquem pela rede. Uma forma para que os não iniciados pudessem entender o que está acontecendo. Nolan consegue tirar o máximo do seu elenco que tem surpresas como Lukas Hass (o menino de “A Testemunha”), Joseph Gordon-Levitt (que saiu da tv para se dar bem em “500 dias com ela”) e até um improvável Di Caprio deixando de ser Di Caprio, como em seus demais filmes e de quebra tem Tom Berenger, Marion Cotillard e Ken Watanabe, incríveis.

Infelizmente, “A Origem” saiu dos Globos de Ouro sem nada para contar história, mas nas demais premiações, este filme conseguiu abocanhar os de melhor roteiro, efeitos e direção, além de trilha sonora. Infelizmente também, a Academia costuma torcer o nariz para os trabalhos que tenham aquele toque que o classificam como “ficção-científica” ou “fantasia”, nas prateleiras de DVDs e provavelmente Nolan corre grave risco de não levar nenhum dos oito Oscars a que está indicado. Talvez o de Direção de Arte, o de Roteiro Original ou os de edição de som. A história dos Oscars já fez essa maldade com “Blade Runner”, só para terem uma idéia, mas para todos nós, “A Origem” é um daqueles filmes obrigatórios por muitos anos daqui para frente.

* (extraído do imdb.com)