Conviver com outra pessoa dentro de você, totalmente fora
dos padrões e ainda por cima nos anos 20 é uma dura tarefa e esse foi o drama
de Einar Wegener, pintor dinamarquês, casado com a também pintora, Gerda. O
drama de quem passou pela cirurgia até então experimental, de troca de sexo,
foi o mote de “A garota dinamarquesa”, que tem mais uma bela atuação de Eddie
Redmayne, o vencedor do Oscar de melhor ator em 2015 por representar fielmente
o físico Stephen Hawkins.
O diretor Tom Hopper, fez de seu filme mais um libelo não ao
homem que tem de passar por uma transformação para seguir em frente, mas
colocar sua companheira como a força maior por trás de tudo. Assim ele o fez em
“O discurso do rei”, onde a Rainha Elizabeth foi o trampolim para o Rei George
VI se tornar um representante digno de sua nação. A mecânica é a mesma nos dois
filmes e talvez o fato de ser uma espécie de estreante, comparado aos demais do
ramo, nos longa-metragens para cinema, é que o fez se repetir e derrapar na
curva dessa forma. Nem por isso deixou de moldar uma bela história de amor.
Esse deslize talvez tenha sido responsável por ter apenas quatro indicações e
estar fora do páreo dos dois prêmios principais. Quem carrega o piano são as
atuações do casal, com um grande destaque para a uma irreconhecível Alicia
Vikander (a bela robô de “Ex-Machina”) na sofrida Gerda.
O apuro está nas atuações shakespearianas e no visual
detalhado, digno de um filme puramente inglês. É belo notar a transposição dos
estilos de arte passando pelo Expressionismo e o Art Decó em cada momento da
vida dos pintores. O desfoque proposital deixa apenas os rostos em destaque
como telas que rodam a 24 quadros por segundo. Também é proposital o fato de
começarem a trama com um Einar já com toques bem femininos, deixando maiores
explicações só no decorrer do filme. Coisas assim não precisam de didáticas
maiores, com o risco de acabar com o roteiro e o que está por trás de tudo:
amor não tem medidas, nem consequências. Você simplesmente vive e se entrega
sem pensar demais. Gerda perdeu os melhores anos da vida em nome de um romance
dos tempos acadêmicos e que se tornou um espelho dela mesma em sua arte. Ganhou
a notoriedade e também, que lições de vida estão quase sempre dentro da Caixa
de Pandora.
Artistas, médicos e psicólogos vão ter muito o que usar como
instrumento para palestras e aulas por um bom tempo. Muitos terão que levar o
estoque de lenços. Alicia provavelmente terá uma estatueta dourada para guardar
na estante e também, a única do filme, mesmo que todos os elementos de um
trabalho de Oscar estejam ali. Só faltou mesmo, o ineditismo.
E eis que em um sábado, pós carnaval, ainda há blocos pela
cidade e muitos ainda estão com suas fantasias. Mais dois dias e elas ficarão
engavetadas e guardadas em seus closets. A outra imagem ficará atrás de mesas e
cadeiras de trabalho. O detalhe ficará por quem terá de conviver com elas na
mente e até quando. Muitos desejarão que histórias de amor não fiquem somente
nos dias folia, mas também nos momentos divertidos e os adversos. E quem
consegue juntar fantasia e amor, sempre sai ganhando.
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